
“Em verdade vos digo que, se não vos converterdes e não vos tornardes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus.” (Mateus 18: 3)
Estas foram as palavras de Jesus quando questionado pelos discípulos acerca de quem era maior no reino dos céus. As crianças. Mas o que significa isso? Ser como crianças?
Os discípulos tinham uma opinião formada. As crianças eram exatamente isso, meras crianças. Intrusas de um espaço de conhecimento que não estava ao seu alcance. Que eram demasiado novas para compreenderem o que o Mestre tinha para ensinar. Que só O iriam importunar. Jesus era o Mestre, e tinha decididamente coisas mais importantes para tratar. Por isso, a sua ação foi clara. Afastá-las da presença de Jesus, e repreender as mães que as traziam para que Ele lhe impusesse as mãos e orasse (Mateus 19: 13-15)
Mas a resposta de Jesus surpreendeu tudo e todos. Não foi de todo a que estavam à espera. Jesus não só pediu que as deixassem vir a Ele porque delas era o reino dos céus, como declarou que se cada um não recebesse o reino de Deus como crianças, de modo algum poderiam entrar nele. (Lucas 18: 15-17).
Para os discípulos, isto foi completamente inesperado. Assim como, provavelmente, para todos os que estavam ao seu redor. Para eles, as crianças eram pequenas e insignificantes. Mas não para Jesus.
Se assim fosse, quem poderia esperar obter atenção divina?
Deus é o Criador dos céus e da terra, Senhor de todo o universo. Aos Seus olhos, somos como nada. No entanto, Ele “atenta para os humildes.” (Salmo 138: 6) Ele “se inclina para ver o que se passa no céu e sobre a terra”, “Ele ergue do pó o desvalido e do monturo, o necessitado,” (Salmos 113: 6-7). E graças a Deus que assim é. Se assim não fosse, pela Sua grande misericórdia, ninguém poderia receber a Sua atenção.
Mas os discípulos não compreendiam isso. As suas mentes ainda não tinham sido completamente transformadas pelo Mestre.
Eles consideravam que as crianças não iriam entender devidamente o momento que lhes estava a ser concedido. Iriam apenas rir e brincar. Mas quantos de nós não agem, precisamente assim? Sem a devida solenidade e respeito perante a Palavra de Deus, e os Seus ensinos?
As crianças brincam com brinquedos. Os adultos brincam com as suas próprias vidas.
Viver pelo divertimento, pelo acumular de bens materiais ou riquezas, pelo número de seguidores nas redes sociais. Pelos likes que os outros lhes podem dar. Pela imagem que é necessário criar.
Para quê? Para quem fica? “Morrendo, nada levará consigo, a sua glória não o acompanhará.” (Salmos 49: 17)
Todo o foco parece estar no agora, neste tempo. E pouco no futuro, na eternidade. Pouco, ou nada, em Deus.
Por isso, quem mais brinca?
Os discípulos consideravam que as crianças logo se esqueceriam do momento especial com Jesus, da sua bênção. Seguiriam as suas vidas sem lembrar do privilégio que tinham acabado de receber.
Mas e os adultos? Como reagem?
Quantos são aqueles que ouvem e ouvem, domingo após domingo, e agem como se nada tivessem ouvido? Como se nada tivessem aprendido? “Pois, com efeito, quando devíeis ser mestres, atendendo ao tempo decorrido, tendes, novamente, necessidade de alguém que vos ensine, de novo, quais são os princípios elementares dos oráculos de Deus; assim, vos tornastes como necessitados de leite e não de alimento sólido.” (Hebreus 5: 12) Assim são muitos adultos.
Mas será que as crianças esquecem mesmo? Não são os acontecimentos e as aprendizagens da infância que lançam os fundamentos da personalidade?
A Palavra de Deus nos ensina: “Ensina a criança no caminho em que deve andar, e, ainda quando for velho, não se desviará dele.” (Provérbios 22: 6) Isto nos mostra precisamente a importância dos ensinos e aprendizagens na infância. E o quanto eles moldam o nosso ser. O modo como percecionamos a realidade e o meio em que estamos inseridos.
Sermos como crianças é deixar que a Palavra de Deus molde o nosso entendimento e transforme o nosso ser. Influencie a forma como percecionamos o mundo em que estamos inseridos. E seja o fundamento que declara o modo como damos cada passo, como nos comportamos, como nos relacionamos, e como nos sentimos. No fundo, como somos.
Talvez os discípulos tenham considerado que as crianças não tinham capacidade suficiente para compreender. Mas será que não tinham?
Os ensinos de Jesus são claros e simples, adequados a qualquer pessoa, por mais humilde que seja. Sem ensino ou escolaridade. São acessíveis a todos. E a qualquer criança.
É verdade que nas Escrituras há grandes mistérios, de difícil compreensão, em que mesmo os mais entendidos não conseguem alcançar o fundo. Mas o conhecimento e compreensão dessas verdades não é essencial para a salvação. Ou então, poucos de nós seríamos salvos.
Lembremo-nos das palavras do apóstolo Paulo: “Irmãos, reparai, pois, na vossa vocação; visto que não foram chamados muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de nobre nascimento; pelo contrário, Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes; e Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são; a fim de que ninguém se vanglorie na presença de Deus.” (1 Coríntios 1: 26-29)
Para além disso, e ao contrário dos adultos, a simplicidade das crianças é clara na forma como interagem com os seus progenitores. Elas confiam plenamente nos seus pais. Que eles estarão lá para as proteger e proporcionar o que necessitam. Que eles estarão lá, para as ajudar, quando se magoarem e atravessarem dificuldades.
Confiamos assim em Deus? Entregamos, desta forma, a nossa vida ao nosso Criador?
A simplicidade das crianças também é óbvia quando perante o Evangelho e os seus ensinos. Elas ainda não foram sobrecarregadas com desilusões, nem mentiras, ou descrenças. Elas não têm hábitos já formados e ideias preconcebidas. Não. Elas estão prontas a receber, solícitas a dar, rápidas a amar. Sem aceção de pessoas.
Amar. O essencial do evangelho de Jesus.
“Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo.” (Mateus 22: 37-39)
“Nisto consiste o amor: não em que nós tenhamos amado a Deus, mas em que ele nos amou e enviou o seu Filho como propiciação pelos nossos pecados.” (1 João 4: 10)
Faltar-lhes-ia então capacidade de arrependimento? Seria isso que os discípulos pensavam?
Certamente que não. Pois qual a criança que, perante a realização de ter feito uma asneira, não chora e rapidamente procura a reconciliação com o seu pai?
E quantos de nós, quando perante a consciência de termos cometido um pecado procuramos prontamente a Deus, em arrependimento e contrição da nossa alma? Quantos de nós procuram rapidamente restabelecer a comunhão com o nosso Pai do céu? Seremos tão prontos quanto as crianças?
Os discípulos pensaram que as crianças não deveriam aproximar-se de Cristo porque elas não eram como eles, adultos. Mas Jesus disse algo incrível. Algo completamente inesperado. Não têm de ser as crianças a crescer e ficar adultas para se aproximarem Dele e entrar no reino dos céus, mas sim os discípulos a tornarem-se como elas.
Aprendamos então com o Mestre, o nosso Senhor Jesus, e deixemo-nos ser completamente transformados pelos Seus ensinos.
Venhamos ao Mestre, como crianças.
“Jesus, porém, disse: Deixai os pequeninos, não os embaraceis de vir a mim, porque dos tais é o reino dos céus.” (Mateus 19: 14)
“E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.” (Romanos 12: 2)
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